A ENCÍCLICA “QUANTA CURA”

 


Tradução por: Gabriel Sapucaia

A ENCÍCLICA “QUANTA CURA”

Por: Mons. Louis-Gaston de Segúr

 

I
O que é uma Encíclica.

Encíclica! Você já leu a Encíclica? Os jornais anticristãos de todas as cores falam dela a torto e a direito. Eles não entendem nada: é muito simples. E, de cem indivíduos que repetem o que diz seu jornal, talvez não haja dois que ousariam responder, se fossem questionados seriamente: "Dê-me sua palavra de honra de que você entende o que está dizendo." Não importa! Quanto menos se entende, mais se grita; e, sob a condução de nossos jornalistas democráticos, tão profundos, tão esclarecidos, tão piedosos sobretudo, o pobre público se volta contra o Papa, que lhe é apresentado como o inimigo público e o perturbador da paz universal.

É isso que acontece hoje, por ocasião da Encíclica de 8 de dezembro. Antes de tudo, seria bom saber o que é uma Encíclica. Tranquilizemo-nos: não há nada de obscuro nem cabalístico nisso. A palavra encíclica vem do grego e significa circular. Uma Encíclica, portanto, é uma carta, uma circular que o Papa, Chefe Supremo da Igreja e Vigário de Nosso Senhor JESUS CRISTO, dirige a todos os Bispos do mundo e, por meio deles, a todos os padres e a todos os cristãos.

Como se pode imaginar, o Papa só escreve essas cartas solenes em circunstâncias importantes. Ele nunca trata senão de assuntos graves que dizem respeito ao bem público; seja em matéria de fé, para condenar erros ou ensinar verdades; seja em matéria de disciplina, para dar regras de conduta, para apaziguar discórdias, para promulgar leis e regulamentos úteis.

Sendo o Papa o Vigário de JESUS CRISTO, o Doutor Supremo e infalível da Igreja, o Bispo dos Bispos, o Pastor Soberano do mundo católico, é evidente que, quando ele ensina ou ordena algo em uma Carta Encíclica, todo cristão, quem quer que seja, tem a obrigação de consciência de se submeter, e, por conseguinte, de condenar o que o Papa condena, rejeitar o que ele rejeita, e conformar-se sem restrições.

II
Na sua Encíclica de 8 de dezembro, o Papa ultrapassa seus direitos e fala de política.

O Papa não ultrapassa nenhum de seus direitos, e fala do que deve falar. À primeira vista, parece política; na realidade, é doutrina religiosa.

Primeiramente, saiba-se bem: o Papa, sendo a autoridade suprema em matéria de ensino, é o único juiz do que deve ensinar e do que tem o direito de ensinar. Portanto, desde o momento em que ele ensina algo, é porque tem o direito de fazê-lo. Aquele que o envia disse-lhe, na pessoa de São Pedro: "Tudo o que ligares na terra será ligado nos céus; e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus." Entenda bem: desprezar a autoridade do Papa seria desprezar a própria autoridade do Filho de DEUS, e é diretamente contra JESUS CRISTO que se revoltam todos aqueles que se revoltam contra os ensinamentos de seu Vigário.

Não nos esqueçamos disso: um cristão que se permitisse zombar de uma Encíclica pontifical, que recusasse a ela se submeter, cometeria certamente um pecado muito grave contra a obediência devida a DEUS e à sua Igreja. "Aquele que crer, será salvo; aquele que não crer, será condenado"; são as próprias palavras do Filho eterno de DEUS, dando ao Papa e aos Bispos a missão de ensinar todos os homens.

Se, na Encíclica de 8 de dezembro, o Papa fala de política, ele o faz apenas do ponto de vista da Religião, do ponto de vista da verdade cristã, do ponto de vista da consciência e do bem das almas. Sob esse ponto de vista, a política já não é política: é moral pública, é religião.

O Papa tem não só o direito, mas o dever de falar sobre tudo aos povos cristãos, pois, nas coisas humanas, não há nada que não toque a consciência de algum modo. Assim, o que há, pergunto eu, de mais temporal, de menos espiritual do que comer e beber? Parece, à primeira vista, que é uma questão puramente culinária, e não de consciência. Contudo, o Papa se envolve, e tem o direito de se envolver, quando ordena a todos os cristãos que não comam carne às sextas-feiras, que façam apenas uma refeição durante a Quaresma, etc. O Papa se envolve aqui, não com a culinária, mas com a penitência; e, ao falar de penitência, ele ultrapassa seu direito?

O mesmo se aplica à política: o Papa só fala dela do ponto de vista espiritual, deixando completamente o campo livre aos governos, desde que os interesses espirituais não estejam mais em jogo. Afinal, o que é política? Política é a direção dada às sociedades e aos Estados temporais. Não é natural que o Papa se preocupe com essa direção? Aqui está um governo, um rei, que estabelece leis contrárias ao bem espiritual dos povos; que ordena o que a Igreja proíbe, ou que proíbe o que a Igreja ordena; que impede a liberdade do ministério dos Bispos e dos padres, instituídos pelo próprio DEUS para salvar e santificar os homens: o Papa, em nome da Religião e da lei de DEUS, reclama contra essa falsa direção dada à sociedade; ele condena essa política, inimiga da Igreja e de DEUS; ele ensina a esse governo o que deve fazer e o que deve evitar, se quiser andar nos caminhos de DEUS: o que há de mais religioso? O que há de mais legítimo? Dizer que o Papa, ao se ocupar assim da política, invade e se mete no que não lhe diz respeito, não é ir contra a evidência do senso comum? Os princípios que regem a política devem sempre repousar sobre a verdade e sobre a justiça; ora, ninguém negará, tudo o que concerne à verdade e à justiça, para as sociedades cristãs como para os indivíduos cristãos, faz parte do cristianismo, e, por conseguinte, da autoridade doutrinal do Sumo Pontífice.

Na Encíclica de 8 de dezembro, Pio IX, Vigário de DEUS, não faz outra coisa; ele cumpre corajosamente seu dever de Papa; e aqueles que o acusam de invasão não sabem, ou não acreditam no que dizem.

III
A Encíclica é inoportuna: o Papa compromete a Religião ao invés de servi-la.

Inoportuna? Você quer dizer: importuna, como observou espirituosamente um dos nossos Bispos. De fato, ela incomoda, e muito, todos os inimigos da Igreja, ao lembrar com firmeza as verdadeiras relações entre Igreja e Estado, os verdadeiros deveres dos governos para com os povos, e os deveres dos povos para com os governos.

Ela é muito oportuna; e a prova disso é que de todos os lados gritam contra os princípios que ela recorda. Esses princípios, tão antigos quanto o cristianismo, eram cada dia mais ignorados: durante trezentos anos, as blasfêmias das seitas protestantes, depois dos políticos, depois dos galicanos, depois dos voltairianos, e, finalmente, dos revolucionários de toda espécie, os envolveram em tal neblina de preconceitos, que uma multidão de pessoas, mesmo cristãs, os vê ou como invenções estranhas, ou como velharias antiquadas, ressurreições da Idade Média. Com o mal sempre crescendo, o Santo Padre não pôde tardar mais em aplicar o remédio sobre a chaga: a chaga é viva e profunda; o remédio, direto e enérgico; eis por que o doente lança altos brados. Se não gritasse, isso provaria que a Encíclica chegou cedo demais ou tarde demais.

Ela é, portanto, muito oportuna; e o Papa, guiado pelo Espírito Santo, falou quando era necessário falar e como era necessário falar. Novamente, o Papa tem a única graça de estado para julgar a oportunidade de seus atos.

É realmente um fenômeno curioso essa compaixão de nossos jornais voltairianos pelo bem da Religião! Quem lhes inspira, de repente, essa terna afeição? Eles não acreditam na Igreja; não acreditam em JESUS CRISTO; não acreditam em DEUS: e eis que estão cheios de solicitude pelos interesses, pelos verdadeiros interesses do Papado!... Hipócritas, se pudessem, nos devorariam; e suas lágrimas não passam de lágrimas de crocodilo! Deixem, então, o Papa cuidar de seus assuntos: a prudência de Roma é proverbial; e quando os Papas desferem grandes golpes, pode-se estar três vezes seguro de que eles não golpeiam levianamente.

Recentemente, um velho galicano, inimigo nato da Santa Sé, adoeceu de raiva e medo ao ler a Encíclica: um bom padre de sua amizade, tendo ido visitá-lo para tentar acalmá-lo, o pobre homem lhe disse: "Mas quem poderia ter aconselhado o Papa a fazer um ato assim? — Se, por acaso, respondeu suavemente e maliciosamente o padre, se por acaso... fosse... o Espírito Santo?"

É "esse acaso" que é a verdade, e é o Espírito Santo que fez o Papa realizar sua Encíclica. Por isso, ela é não só muito verdadeira, mas muito útil e muito oportuna: importuna, talvez; mas inoportuna, não.

IV
O Papa quer sufocar o espírito moderno.

Você acha?... O que é, então, esse tal espírito moderno? Você sabe? Aposto que não. E isso não é surpreendente: quem sabe?...

Para mim, o que sei é que, se o espírito moderno é algo bom, o Papa não quer sufocá-lo; o Papa é o guardião da justiça e da verdade aqui na terra: tudo o que é justo, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é bom, Pio IX aprova e abençoa no mundo moderno, como seus predecessores sempre fizeram no mundo antigo. Mas se o espírito moderno não vale nada, se é contrário ao cristianismo, que é a verdade eterna, agradeçamos ao Papa que quer nos livrar dele.

Infelizmente! Sim, o Papa gostaria de sufocar o que nossos incrédulos e nossos revolucionários chamam há cem anos de espírito moderno. Esse espírito, apesar dos belos nomes com que é adornado, não é outra coisa senão o espírito de revolta contra a fé, de revolta contra todas as autoridades legítimas; é a incredulidade que, sob o nome de filosofia e de razão, quer aniquilar o cristianismo; é a licenciosidade que, sob o nome de liberdade, quer destruir a autoridade da Igreja, a autoridade dos Soberanos temporais, e, na família, a autoridade paterna; é o despotismo que, sob o nome de legalidade e de poder, quer sufocar todas as verdadeiras liberdades: a liberdade religiosa, a liberdade eclesiástica, a liberdade civil, a liberdade de educação e ensino, e até mesmo a liberdade da família, com os direitos sagrados da propriedade. No fundo, é isso que se chama de espírito moderno. De fato, ele é moderno, em oposição ao velho mundo cristão, todo impregnado do espírito católico.

Esse espírito moderno também é chamado de Revolução: ora, a Revolução é a negação da Igreja e a coalizão de todas as forças humanas e diabólicas contra o reino de JESUS CRISTO na terra. Você acha estranho que o Papa, Chefe da Igreja, seja o inimigo nato da Revolução e queira sufocar o que você chama de espírito moderno?

Há cem anos, assim como antes, há coisas boas nas instituições e nas sociedades: o Papa abençoa e aprova essas coisas boas, que não devem ser confundidas com o espírito moderno e revolucionário.

V
A Encíclica ataca as constituições modernas.

A Encíclica não ataca nada, nem ninguém. Ela diz simplesmente: Do ponto de vista da fé, tal princípio social é verdadeiro, e tal outro princípio é falso; isto é uma verdade, e aquilo é um erro; quem ama a verdade, escute minhas palavras e se esforce para fazer delas a regra de sua conduta.

Há, você diz, constituições modernas que não estão totalmente de acordo com o ensino infalível do Papa. — O que se há de fazer? É um sinal certo de que, em muitos pontos, elas não estão de acordo com a lei de DEUS, com a verdade e a justiça. Nesse caso, para um povo que quer continuar cristão, só há uma coisa a fazer: é corrigir, tanto quanto possível, os defeitos de sua Constituição, conforme o ensino de JESUS CRISTO e de seu Vigário.

Os povos não devem agir como os indivíduos: amar e praticar o bem, odiar o mal e eliminá-lo em toda parte onde o descobrem, pelo menos tanto quanto as circunstâncias permitem? Isso é o ABC da moral cristã e do bom senso.

Sem dúvida, uma sociedade pode fechar os olhos a essa luz e não fazer o que a Igreja lhe diz: mas é por sua própria conta e risco; e, se cair no abismo das revoluções, só poderá culpar a si mesma. É como um cristão que pode, se quiser, violar os mandamentos de DEUS e da Igreja, com a consequência de cair depois no fogo eterno do inferno.

Fala-se constantemente das constituições modernas; e sempre se esquece da grande constituição divina, que é a lei eterna de DEUS, tão antiga quanto o mundo, de que JESUS CRISTO é o Rei supremo, e que a Igreja Católica é encarregada de fazer observar por toda a terra. Que fique bem claro: nenhum Estado, nenhum príncipe, nenhuma lei humana, tem o direito de violar essa constituição, que deve servir de base e de regra para todas as constituições dos reinos e impérios. Não é justo que os reis e as leis obedeçam ao bom DEUS? Uma lei, uma constituição que fosse contrária em algum ponto à vontade de DEUS, que o Papa é encarregado de tornar conhecida ao mundo, obrigaria todo cristão a repetir a célebre frase dos Apóstolos: “É melhor obedecer a DEUS do que aos homens.”

Se, portanto, há constituições modernas, e há muitas que não estão plenamente de acordo com o reino de JESUS CRISTO e com o ensino de sua Igreja, não é culpa de Pio IX, e deve-se reconhecer que a Encíclica não faz mais do que defender a constituição de DEUS, atacada e minada pelas ideias revolucionárias.

Acrescentemos, no entanto, que a Igreja não proíbe de modo algum que os católicos que vivem sob o regime de uma dessas constituições imperfeitas, onde o falso se mistura com o verdadeiro e o mal com o bem, prestem juramento de fidelidade ao Soberano e obedeçam à Constituição: a Santa Sé declarou isso formalmente e em várias ocasiões.

É assim que os primeiros cristãos podiam, em consciência, prestar juramento de fidelidade aos Césares pagãos e às leis do império. Assim fazem ainda hoje os católicos que servem ao Estado em países protestantes ou cismáticos.

 

VI
A Encíclica é um ultraje ao governo francês.

Isso é uma mentira, uma mentira astuta, inventada pelos revolucionários, inimigos ao mesmo tempo da Igreja e do governo. A Encíclica dirige-se não apenas a todos os países, mas também a todos os tempos; em mil anos, em dez mil anos, se o mundo ainda existir, ela será, como hoje, a verdade prática sobre as relações entre a Igreja e o Estado. Quando o Papa fala, é o Espírito Santo que fala; e o Espírito Santo fala para todos os tempos e para todos os países.

Nós, franceses, realmente temos muito orgulho; parece que não há nada além da França na Igreja Católica. Nossa França tem boas e grandes qualidades, que o Papa se agrada em reconhecer; por causa dessas boas qualidades, ele nos ama. Mas também temos nossos defeitos, e nosso governo tem defeitos como todos os governos. A Encíclica é uma luz oferecida à França como a todos os outros países do mundo: cabe a nós aproveitá-la, se quisermos garantir nosso futuro. A França não pretende ser infalível, mesmo em suas constituições civis e políticas; enquanto o Vigário de DEUS é garantido a infalibilidade em todos os seus ensinamentos.

Amemos e abençoemos Pio IX, que nos ama; e não escutemos seus inimigos, que são nossos inimigos.

VII
O Papa quer esmagar os poderes civis e reduzi-los à servidão.

Sério?... Pobres poderes civis! Ameaçados pelo terrível cordeiro, devem estar morrendo de medo, tremendo por sua liberdade!...

De fato, quando lemos essas coisas em todos os jornais irreligiosos, parece um sonho, e nos perguntamos que nomes dar a esses grandes artigos de política transcendente que acusam o Papa de intromissão. Estão zombando do bom senso público? E essas farsas sacrílegas não são verdadeiros crimes?

O Papa não quer mais esmagar os poderes civis do que um bom pai quer esmagar seus filhos. Ele não quer reduzi-los à servidão; mas gostaria que eles observassem a lei de DEUS, a única garantia de paz e felicidade.

Os chefes de Estado são os filhos mais velhos da grande família católica; e, quando se afastam da justiça e da verdade cristã, o Pai da família, o Santo Padre, os adverte, os chama de volta, faz-lhes críticas legítimas, esforça-se para trazê-los de volta ao caminho correto. Ele dá imensa importância a esse retorno, porque sabe quão decisiva é, para a salvação dos povos, a fidelidade ou a infidelidade daqueles que os governam. Pio IX é um bom pai, e cumpre santamente seu dever ao tentar trazer de volta a JESUS CRISTO as sociedades modernas e os poderes civis que parecem não querer mais a Igreja. Será isso esmagá-los e reduzi-los à servidão?

A servidão está inteiramente, assim como a tirania, do lado da Revolução, que é dura e brutal, que não hesita diante das injustiças nem das perseguições, nem diante dos patíbulos sangrentos; nós a vimos em ação em 1789, em 1791, em 1795; e, nos últimos anos, nós a vemos em ação na infeliz Itália. É ela quem esmaga os homens, quem viola todas as liberdades, quem pisa todos os direitos! Para ela, nada é sagrado, nem a Tiara, nem a Mitra, nem a Coroa; ela destrói tudo em seu caminho... Ai do povo que cai nas mãos da Revolução!

A Revolução acusa o Papa de querer fazer o que ela faz todos os dias: como o ladrão que grita "pega ladrão" para enganar os policiais e desviar os golpes da justiça.

Quanto mais um governo é católico, quanto mais um povo é dócil à voz do Papa, mais também o poder civil é respeitado, os magistrados são obedecidos, e todas as verdadeiras liberdades são protegidas e florescentes. O Papa é o verdadeiro Pai dos Soberanos e dos povos.

VIII
O Papa é inimigo da civilização e do progresso.

A tática da Revolução é confundir as ideias e, sob o véu dos nomes mais respeitáveis, apropriar-se para seu próprio proveito de tudo o que há de melhor aqui na terra. O que há de mais respeitável em si, o que há de melhor do que a civilização, o progresso, a liberdade? A Igreja nunca quis outra coisa senão isso, e ela deu isso ao mundo.

A Revolução, que é astuta e tortuosa como a velha serpente, seu pai, rouba do cristianismo seus belos nomes e suas grandes conquistas, que pertencem somente a ele; com uma arte pérfida, ela guarda o nome, mas muda tão bem a coisa, que no lugar de um vinho excelente nos dá veneno.

Para nós, cristãos e pessoas honestas, a civilização, o progresso, é um bem excelente, que consiste na melhoria contínua dos homens e das coisas; é o desenvolvimento abençoado de tudo o que é útil aos homens, de tudo o que pode torná-los melhores, de tudo o que pode torná-los verdadeiramente felizes; é a diminuição da miséria e do mal na terra; é, em uma palavra, a expansão do reino benéfico de JESUS CRISTO, o único Salvador e o único Consolador do homem decaído. Esse verdadeiro progresso, longe de excluir o desenvolvimento do bem-estar material, ao contrário, o chama com todos os seus desejos, desde que tudo permaneça em ordem e que a prosperidade do corpo não prejudique a prosperidade da alma.

Para a Revolução, não se enganem, a civilização e o progresso são outra coisa: é a sociedade civil se libertando cada vez mais da fé; é a humanidade renunciando ao seu batismo, dizendo a Cristo e à sua Igreja: “Eu não quero mais vocês!” É o homem que não quer mais colocar sua felicidade e suas esperanças nos céus, e agora as busca nas satisfações materiais, nos prazeres dos sentidos, no luxo, no dinheiro, como faziam os pagãos de outrora. É a sociedade que não quer mais ser católica; são os poderes civis que não querem mais outras regras além de seus caprichos; as leis humanas, outra base além da força bruta; em uma palavra, é a apostasia dos Estados e dos povos.

Belo progresso, de fato!... É verdade: temos iluminação a gás; temos ferrovias e telégrafos elétricos (o que é muito conveniente); escrevemos mil vezes mais cartas (o que é realmente penoso); as operárias têm vestidos de seda; as camponesas usam saias armadas (o que é bastante ridículo); os aprendizes se vestem como pequenos príncipes (o que é totalmente inadequado); quase todo mundo sabe ler; os jornais, quase todos ruins, inundam as cidades e os campos (o que é deplorável);... mas, com tudo isso, onde está a felicidade, a verdadeira felicidade? A alegria aumenta na mesma proporção do luxo? A pobreza diminui? Salvam-se mais almas facilmente? Os costumes públicos são mais puros? Com a mão na consciência, onde está o progresso?... De todos os lados, só se ouvem murmúrios e ameaças de revolução; todos concordam que a Europa está sobre um vulcão; os melhores Soberanos fazem o que podem, mas não conseguem consolidar seus tronos, que são regularmente levados a cada quinze ou vinte anos pela onda furiosa desses povos que nos dizem serem tão felizes, tão satisfeitos.

O Papa é o inimigo desse falso progresso, dessa civilização mentirosa e ímpia; e isso porque ele é o amigo e o pai do verdadeiro progresso, da verdadeira civilização cristã. Voltemos ao Papa, após as duras experiências dessas revoluções fomentadas por essa "civilização moderna"; o filho pródigo encontrou apenas nos braços de seu bom pai a honra e a felicidade que suas loucuras lhe haviam feito perder.

IX
O Papa condena a liberdade de consciência.

Você quer dizer “a liberdade de não ter consciência”; ou, o que dá quase na mesma, “a liberdade de envenenar sua consciência”? Você tem razão: o Papa é o inimigo mortal dessa terrível liberdade. Qual pai daria ao seu filho a liberdade de se envenenar?...

Foi o Protestantismo que inventou, e foi a Revolução que aperfeiçoou o que os incrédulos hoje chamam de liberdade de consciência. Faz parte do progresso, desse progresso anticristão de que falávamos há pouco; e insinuou-se nas instituições modernas.

Deixemos de lado essas belas teorias e vamos direto à prática.

Na prática, eis em que consiste essa liberdade de consciência: não levar em conta senão as leis civis, sem se preocupar em nada com as leis religiosas; zombar impunemente de DEUS e de JESUS CRISTO; poder dizer isso e poder imprimir isso; zombar do Papa e dos Bispos; vilipendiar o clero, os religiosos, as instituições católicas; violar todos os mandamentos de DEUS e da Igreja; nunca orar, não respeitar nem domingos nem dias santos; desprezar todas as autoridades religiosas e, sobretudo, entregar-se livremente a todas as paixões vergonhosas condenadas pelo sexto mandamento, exceto certos excessos previstos pela lei civil e reprimidos pela polícia; finalmente, morrer como pagãos, como animais.

É verdade ou não que, na prática, a famosa liberdade de consciência não consiste em poder fazer tudo isso impunemente?... E querem que o Papa aprove essa liberdade, essa liberdade da impiedade? Querem que ele sancione as leis que a protegem?... Mas não é necessário ser Papa, basta ser cristão para rejeitar com indignação uma liberdade, eu deveria dizer uma loucura dessas. Ela supõe, evidentemente, que não há DEUS, nem céu, nem inferno; que JESUS CRISTO não é DEUS; que não há uma religião verdadeira; que a Igreja não tem autoridade divina na terra; e que, entre os povos cristãos, as leis humanas não precisam ser cristãs.

Quer saber em que consiste a verdadeira liberdade de consciência, a liberdade que o Papa reivindica para cada um de nós e que o espírito moderno nos nega tanto quanto pode? Consiste em poder cumprir livremente todos os nossos deveres de católicos, de filhos de DEUS. Ora, para isso, é preciso que o Papa, Chefe da Igreja, possa comunicar-se livremente com os Bispos e transmitir-lhes seus ensinamentos e seus decretos soberanos; é preciso que os Bispos possam comunicar-se livremente com o Papa, comunicar-se entre si, e cumprir com o clero e os fiéis de suas dioceses todo o seu ministério pastoral; é preciso que os padres possam pregar livremente toda a verdade católica, administrar os sacramentos, salvar e santificar as almas; é preciso, enfim, que cada fiel possa, livre e sem impedimentos, ouvir o padre, conhecer o verdadeiro DEUS, praticar a verdadeira fé, professar a verdadeira religião. Quando se tem tudo isso, tem-se a liberdade de consciência, a verdadeira, a boa liberdade de consciência.

A outra, a má, é condenada pela fé e pelo Papa, porque não passa, afinal, da liberdade do mal.

A liberdade de seguir a própria consciência, mesmo se estiver errando, não faz parte da liberdade de consciência condenada pela Encíclica: católicos, protestantes, judeus, todos somos obrigados a obedecer à nossa consciência; enquanto ela se enganar de boa fé, isso não é mais que um infortúnio; e o que a Igreja pede é que todo homem possa evitar esse infortúnio, tendo plena liberdade de abraçar a verdade assim que a conhecer.

Em resumo, o Papa condena a liberdade de consciência, mas não a liberdade da consciência. São coisas bem diferentes.

X
Ao condenar a liberdade de cultos, o Papa quer obrigar os governos a perseguirem os incrédulos, os protestantes, os judeus, a renovar as dragonnadas e a reacender fogueiras da Inquisição em todos os lugares.

O Papa não quer nada disso; e aqueles que dizem isso não acreditam na primeira palavra. Pio IX diz simplesmente aos governos católicos (pois ele só se dirige a eles): “Há apenas uma única religião verdadeira, porque há um único DEUS, um Cristo, uma fé, um batismo; e essa única religião verdadeira, não se esqueçam, é a religião da santíssima Igreja Católica, Apostólica, Romana. Se, por causa da infelicidade dos tempos, um governo católico é obrigado a colocá-la no mesmo nível que as falsas religiões — protestante, judaica, muçulmana, etc. — deve, pelo menos, lamentar esse estado de coisas e nunca considerá-lo um estado regular e normal. Isso equivaleria a rebaixar a verdade ao nível do erro; seria desprezar a fé.

"Um governo verdadeiramente católico deve, então, facilitar o máximo possível aos Bispos e sacerdotes o exercício de seu santo ministério, para que possam, através da persuasão e do zelo de sua caridade, trabalhar mais eficazmente pela conversão dos hereges e de outros dissidentes. Deve impedir, tanto quanto permitam as circunstâncias e as leis da prudência, a difusão da heresia; deve, enfim, tentar, tanto no interesse próprio quanto no da Igreja, proporcionar a todos os seus súditos o benefício inestimável da unidade religiosa, e, por conseguinte, da paz.”

O Papa não pede outras dragonnadas senão estas: deve-se reconhecer que elas não são nem perigosas nem sangrentas. Ele incentiva os soberanos católicos a fazer por seus súditos o que faz um bom pai de família por seus filhos e servos; facilita-lhes, por todos os meios possíveis, o conhecimento e a prática da religião; afasta deles, tanto quanto possível, tudo o que poderia alterar sua fé e corromper seus costumes; tolera o mal que não pode impedir; mas não perde uma ocasião de condenar esse mal e de reprimi-lo, se não puder eliminá-lo completamente.

Quanto às fogueiras da Inquisição, elas não têm lugar aqui; e, de fato, não há outras fogueiras senão aquelas em que os tolos têm medo. Sobretudo em nossos tempos, a Igreja só quer conquistar as almas pelos meios da doçura. Quem pensaria em usar a violência para impor a fé? Mesmo lamentando-os e tentando iluminá-los, a Igreja Católica respeita aqueles que estão de boa fé no erro. Intolerante e absoluta quando se trata de doutrinas, é de uma tolerância cheia de caridade quando se trata apenas de pessoas.

XI
A Encíclica causa desordem por toda parte; todos a atacam: portanto, ela é ruim.

Portanto, ela é muito boa. A desordem estava presente em todos os espíritos: a palavra do Papa quer restabelecer a ordem em todos os lugares. É uma operação cirúrgica que assusta o mundo doente; ele tem medo, se revolta; é muito simples. Mas isso prova que a operação não seja necessária e benéfica?

Você diz que todo mundo é contra o Papa? Pois bem, na Sexta-feira Santa, em Jerusalém, todo mundo não clamava contra Nosso Senhor? O divino Salvador era culpado por isso?

Todo mundo ataca a Encíclica? Isso prova apenas que todo mundo, ou quase todo mundo, desconhecia os princípios da Igreja sobre as grandes questões sociais. Graças às nossas revoluções, graças ao dilúvio de livros ruins e, sobretudo, de jornais anticristãos que inundam a pobre Europa há mais de um século, os princípios mais elementares foram esquecidos, e as mentes mais retas têm dificuldade em distinguir a verdade. Não é inteiramente culpa deles; pois é muito difícil resistir ao fluxo dos erros públicos. A ignorância desculpa muita coisa diante de DEUS.

Agora, à luz da palavra pontifícia, essa ignorância começará a dissipar-se pouco a pouco, pelo menos entre os homens sinceros; e a Encíclica promete à sociedade um futuro melhor.

Além disso, seu “todo mundo” é um tanto exagerado, me parece. Será que todos os nossos Bispos não são algo no mundo? Eles não formam, com o Papa, a mais majestosa, a mais poderosa e, ao mesmo tempo, a mais competente de todas as autoridades em tal matéria? Será que os quatro ou cinco mil padres, espalhados por todo o universo, não são algo também, e algo considerável? Será que os milhões e milhões de fiéis católicos, que saudaram a Encíclica como uma palavra vinda do céu, também não devem contar na balança? Mas essa é a elite da humanidade; e ela está com Pio IX!

Portanto, nem todo mundo clama contra esse grande ato de salvação pública; os pobres que se assustam são justamente aqueles que mais precisam dela. A luz só machuca olhos doentes.

XII
Há bons católicos que criticam a Encíclica.

Os católicos que criticam a Encíclica são, asseguro-lhe, católicos de água doce. São católicos que mal têm o espírito católico, ou seja, o espírito de fé, o espírito de submissão e obediência ao Chefe da Igreja.

Para ser um bom católico, não basta ser batizado e ir à missa aos domingos: é preciso, além disso, ser um verdadeiro filho da Igreja, um discípulo fiel e dócil dos Pastores da Igreja, e, sobretudo, do Pastor supremo, que é o Papa. Um verdadeiro católico é um cristão que obedece em tudo a JESUS CRISTO e ao seu Vigário.

Esteja certo de que os poucos católicos que agora murmuram contra a Encíclica do Santo Padre são ou cristãos pouco instruídos que criticam o que não entendem, ou pessoas que têm pouco de católicos, além do nome. Não seja um deles; seja dócil à voz dos Bispos; e, diante dos ensinamentos da Encíclica como diante de todos os outros atos da Santa Sé, lembre-se da grande palavra do Filho de DEUS: “Quem crer será salvo; quem não crer será condenado.”

A salvação das sociedades, assim como a dos indivíduos, está na obediência à santa Igreja Católica.

XIII
O Papado está morrendo, e a Encíclica é o grito de sua agonia.

Singular agonia essa força prodigiosa que, sozinha, basta para abalar o mundo e comover todos os povos! Em geral, os moribundos não têm uma voz tão forte.

Grito de agonia? Sim, como o grito do Papado nas catacumbas. Nunca o Papa fala mais alto e vive mais plenamente do que quando, humanamente falando, tudo parece perdido. Hoje, Pio IX está nesse terrível e abençoado estado: roubaram-lhe tudo; resta-lhe apenas um pequeno pedaço de terra; ele é caçado de todos os lados pela Revolução triunfante; parece perdido; falta-lhe tudo, exceto DEUS. Por isso ele é tão forte, tão vivo. Ele não tem medo; e com razão: o bom DEUS o assiste tanto mais quanto menos os homens o assistem.

Cem vezes, desde a crucificação de São Pedro, os ímpios acreditaram ver chegar, finalmente, o último dia do Papado: eles ainda aplaudiam, e já, coisa estranha! Eram eles que se encontravam derrotados. No momento do enterro, o morto ressuscitava e enterrava aqueles que se preparavam para enterrá-lo. É que o Papado, como seu divino Fundador, tem a vida em si mesmo e não pode morrer. Ele ressuscita e sempre ressuscitará.

Como lembrou recentemente um ilustre Arcebispo: trinta e cinco vezes, ao longo dos séculos, os Papas foram expulsos de Roma; e trinta e cinco vezes voltaram a entrar.

Não temamos pela vida do Papado; ela vem do céu. Temeremos, antes, por nossa própria vida, que o demônio e o mundo podem nos tirar; temeremos por nossa fé, pela pureza do nosso cristianismo: em um século como este, a fé corre grandes perigos; e só uma fidelidade absoluta à Igreja e ao seu Chefe pode mantê-la em segurança. As pessoas que se preocupam tanto com a morte iminente do Papado fariam melhor em se preocupar um pouco mais com sua própria morte. Essa morte talvez esteja mais próxima do que pensam.

Não é a eles, mas ao Papado que DEUS disse: “As portas do inferno não prevalecerão contra ela.”

 

XIV
Não há consenso sobre o significado da Encíclica.

No campo inimigo, isso não é surpreendente: eles não entendem nada; esqueceram até a primeira palavra de seu catecismo; e é principalmente quando falam de religião que vagueiam de maneira fabulosa.

Entre nós, nas fileiras dos fiéis, todos estão de acordo sobre o essencial; todos se submetem de coração e mente ao ensinamento infalível do Soberano Pontífice; todos respeitam a Encíclica, até nas suas mínimas palavras; todos buscam de boa fé as verdades salutares que ela contém.

Se ainda há alguma divergência de opinião sobre a maneira de entender certas passagens menos claras, é porque a Santa Sé e os Bispos ainda não explicaram em detalhe todas as doutrinas da Encíclica. A luz virá pouco a pouco; mas desde já, pode-se ter certeza de que todos os verdadeiros filhos da Igreja terão nisso apenas uma crença, e uma única voz para professá-la, para professá-la publicamente.

Além disso, essas pequenas divergências, que não afetam a fé católica, são frequentemente mais aparentes do que reais: elas vêm do ponto de vista que se adota. Ao explicar a Encíclica, alguns têm principalmente em vista os inimigos da Igreja, os incrédulos, os maus jornais; outros estão mais preocupados com a necessidade de esclarecer, aprofundar todas as questões, para que não reste dúvida nas mentes e para que a unidade mais perfeita reine na grande armada católica. Esses dois pontos de vista são excelentes; mas dão às explicações uma cor diferente.

O que é certo é que todos nós, sem exceção, condenamos o que o Papa condena, no sentido em que ele condena. Sobre este ponto, que é o único necessário, todos nós, como os primeiros cristãos, “temos um só coração e uma só alma.” A tática do inimigo seria nos dividir, para triunfar mais facilmente sobre nós: com a graça de DEUS, permaneceremos unidos; unidos na obediência ao Papa e aos Bispos; unidos no terreno do ensino apostólico.

Apertemo-nos mais firmemente do que nunca em torno desta Cátedra de São Pedro, da qual Santo Agostinho disse, já no quarto século: “DEUS depositou a doutrina da verdade na Cátedra da unidade.”

Sejamos fiéis ao Papa em todas as coisas; nas circunstâncias atuais, sejamos mais submissos do que nunca à sua autoridade. Nunca nos permitamos falar dele de forma leviana; na medida do possível, não permitamos que zombem dele na nossa presença. Não leiam jornais hostis à Igreja. Afastemo-nos dos inimigos do Papa: DEUS não está com eles; e, ao frequentá-los, corremos o risco de agir e falar como eles.

Sobretudo, não tenhamos medo: a causa do Papa é a causa de DEUS, e cedo ou tarde ela triunfará.

NOTA: Não preciso dizer que eu repudio antecipadamente tudo o que, apesar dos meus cuidados, poderia ser encontrado aqui, mesmo que minimamente, em desacordo com o ensinamento da Santa Sé.

 

 

 

 

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