AS HERESIAS DO SEDEPRIVACIONISMO E DO CONTINUÍSMO

 

Por: Gabriel Sapucaia

 

A DESTRUIÇÃO DO PAPADO OPERADA POR DOIS PADRES:
Dom Guerrard des Lauries, O.P e Pe. Bernard Lucien.


1. As heresias do sedeprivacionismo

O presente texto se trata de uma refutação feita contra o escrito "O Problema da Autoridade na Igreja pós-conciliar: A Tese de Cassiciacum", de Bernard Lucien, este que já foi um padre católico e defensor da posição sedeprivacionista, ou seja, de que Paulo VI e João Paulo II eram "papas materiais". Eu sei, caro leitor, que nem todos estão acostumados com terminologias como "Igreja pós-conciliar", "Papa material" ou mesmo não conheciam a dita "Tese de Cassiciacum", o que me levou a decidir explicar o que cada um destes termos significa para logo após expor a refutação.

De modo breve e simples, o termo "Igreja pós-conciliar" significa literalmente uma Igreja diferente da Igreja Católica anterior ao Concílio do Vaticano II, ou seja, "pós-conciliar" significa uma Nova Igreja, haja vista que não poderia ser a mesma nem de acordo com Lucien, nem de acordo com outros que utilizaram essa terminologia, tal como Marcel Lefebvre, e nem de acordo com Mons. Castro Mayer, haja vista que o mesmo Mons. Castro Mayer em uma obra intitulada de "O Pensamento de Mons. Castro Mayer" da editora Permanência afirmar categoricamente que aqueles que aderem ao Vaticano II caem por este fato em cisma. Portanto, como a Fraternidade Sacerdotal São Pio X e a chamada "Resistência" de Richard Williamson dizem apoiar o pensamento de Marcel Lefebvre e Mons. Castro Mayer, vamos entender que todos eles admitem que "Igreja pós-conciliar" tem este mesmo significado: uma Nova Igreja. Porém, não estamos de todo afirmando que para Lucien esta Igreja pós-conciliar signifique literalmente uma Nova Igreja, mas apenas de modo análogo, ou seja, por analogia.

Após ter explicado brevemente o que significa "Igreja pós-conciliar", custa clarificar o que significa "Papa material" de acordo com Lucien e os demais sedeprivacionistas. Para eles, "Papa material" significa que, os famigerados: Montini (Antipapa Paulo VI) e Woytjla (Antipapa João Paulo II) são, na verdade, "materialmente" Papas, ou seja, sua eleição foi válida, mas não receberam a autoridade de Deus por conta de seus atos contrários ao bem comum da Igreja, ou, significa que estes homens são Papas heréticos, ou seja, a eleição foi válida, mas eles perderam sua autoridade por conta de suas ações prejudiciais ao bem comum da Igreja. Essa é a doutrina da dita "Tese de Cassiciacum" cuja autoria é de Mons. Guerrard des Lauries, O.P, fundador do sedeprivacionismo.

Feita a breve explicação, darei início às refutações, dividindo cada uma de acordo com cada parte de seu argumento e depois reunirei todos os argumentos em síntese para que o leitor mais simples possa entender o que foi exposto por Lucien. Ao final de tudo, mostrarei as heresias contidas em seu escrito.

1º ARGUMENTO: São tradicionais os católicos que acreditam ser o Concílio Vaticano II (CVII), assim como as reformas oficiais subsequentes, um afastamento do ensinamento da Igreja Católicatal como fora transmitido até o início do CVII. Sendo a crítica dos católicos tradicionais direcionada não aos abusos litúrgicos cometidos, ou à influência de figuras acatólicas no Episcopado, mas, acima de tudo e essencialmente, trata-se de uma crítica aos erros e desvios cometidos no próprio CVII em seus documentos, assim como aos erros e desvios nas reformas oficiais, tal como dos Sacramentos e da Nova Missa, estas que foram alvo de muitas críticas e resistências, tal como às palavras de Montini e Woytjla que enfatizaram serem tais reformas baseadas exclusivamente no CVII. Consequentemente, indaga-se: qual é a autoridade do Episcopado comprometido com o CVII e, acima de tudo, do Bispo de Roma que se comprometeu com o CVII e ensina coisas inaceitáveis para a fé católica?

Citação de Lucien:

Por conveniência, chamaremos de "tradicionais" aqueles católicos que acreditam que o Segundo Concílio Vaticano e as reformas que se seguiram afastaram-se do ensinamento da Igreja Católica como foi transmitido até o presente momento, ou seja, até o Vaticano II. A crítica dos católicos tradicionais não se dirige aos abusos cometidos por membros da Igreja docente, nem está preocupada com as derivações de indivíduos mais ou menos conectados ao Episcopado. Ela é acima de tudo e essencialmente uma crítica aos erros e desvios contidos no próprio Concílio, nas reformas oficiais que se seguiram (particularmente em relação à liturgia e aos sacramentos), e nas declarações e escritos de Paulo VI e João Paulo II, que alegam se basear e desenvolver os ensinamentos deste Concílio.[1]

Breve refutação: Lucien, antes do capítulo 1 de seu escrito, afirma que o CVII foi um afastamento do ensinamento da Igreja, ensinamento esse que Lucien afirma serem erros e desvios doutrinários, ou seja, uma doutrina que é inaceitável para a fé católica, tal como ele conclui. Tal é a doutrina que o Bispo de Roma (Papa) se comprometeu. Então, ele afirma que o Romano Pontífice pode se comprometer com ensinos que se afastam da doutrina católica, o que é herético. O Concílio do Vaticano na Pastor Aeternus foi claro: o Romano Pontífice e seus sucessores sempre estiveram imunes de todo o erro. Dizer que um Papa no exercício do seu magistério papal possa cair em heresia é afirmar que as portas do inferno prevaleceram na Igreja. Todos os teólogos concordam com essa afirmação.

2º ARGUMENTO: Estes católicos tradicionais estão divididos em quatro grupos: os continuístas[1]; os que reconhecem o papado dos Antipapas Paulo VI-Francisco, mas resistem ao mesmo[2]; os sedevacantistas [3]; e os sedeprivacionistas[4]. O primeiro e o segundo posicionamento defendem que estes Antipapas são na verdade Papas verdadeiros, e que são passíveis ou de crítica ou de resistência. Um jargão bem conhecido e aplicado à eles é o de que eles "peneiram o magistério" e aceitam o que julgarem ser católico, assim como, de modo contrário, rejeitam e combatem o que julgam ser errado. Já os últimos (sedevacantistas e sedeprivacionistas), afirmam que estes Antipapas de fato são hereges. No entanto, Lucien afirma que a diferença entre o sedevacantismo e o sedeprivacionismo é apenas uma: os primeiros afirmam que o Antipapa foi deposto imediatamente após sua heresia pública e os sedeprivacionistas afirmam que o Antipapa ainda não foi deposto, e, portanto, permanece papa material (sem autoridade).

Citação de Lucien:

Na Presente Crise da Igreja: 1.) O Papa mantém sua autoridade Pontifical, que é divinamente assistida. E deve-se submeter às suas decisões disciplinares, ao mesmo tempo em que se denunciam os erros doutrinários de seu ensinamento e sua responsabilidade pessoal por eles (CRC[5]). Mas não se deve submeter às suas disposições disciplinares. É necessário transmitir os Sacramentos e a Fé contra sua autoridade ("ECONE"). [6]2.) Ele não possui mais sua autoridade Pontifical divinamente assistida. Ele é deposto por causa de sua heresia pessoal. ("Sedevacantismo[7]") Mas ele ainda não foi deposto: ele ocupa materialmente o trono Apostólico. ("Tese de Cassiciacum") Como se pode ver, a Tese de Cassiciacum é completamente diferente das teses que afirmam que a Autoridade continua a existir naqueles que ocupam a Sé Apostólica, e daquelas que afirmam que Paulo VI e João Paulo II são simplesmente depostos, que são antipapas e que a Sé está vaga.[8]

Breve refutação: É aqui onde Lucien começa seus equívocos. Os sedevacantistas não afirmam que "Paulo VI" em 1965 caiu em heresia pública e foi deposto do papado por Lei Divina. O que de fato nós sedevacantistas afirmamos é de João XXIII até Francisco, todos, sem exceção, são Antipapas, ou seja, que os conclaves posteriores a morte de Pio XII foram nulos, sem efeito, inválidos e ilegítimos. O que Lucien faz é semelhante ao que um neurótico faz em relação à realidade objetiva: ele, primeiramente, adapta de forma exclusivamente teórica, a realidade em favor de seu argumento para que possa encaixá-lo e torná-lo lógico. Ou Lucien fez essa adaptação desonesta ou ele é um completo ignorante sobre o que é sedevacantismo, algo que para mim é absurdo de se dizer dele já que teve tempo de sobra para os estudos. Uma das diferenças entre o sedevacantismo e o sedeprivacionismo é que enquanto este afirma que os Antipapas foram validamente eleitos, aqueles afirmam que sequer o conclave foi válido e que, portanto, a eleição foi completamente nula. Consequência: para os sedeprivacionistas, basta que o eleito se converta e será Papa, mas para os sedevacantistas uma conversão deles não resolve nada, algo que será explicado posteriormente com mais detalhes.

3º ARGUMENTO: Tendo como base os equívocos no início de seu texto, Lucien dá continuidade afirmando que a Tese se mantém à parte do debate acerca de um Papa herético poder ou não ser deposto, algo que os continuístas e os R&R tem em comum com os sedeprivacionistas, haja vista que no âmbito prático eles chegam à mesma conclusão de Lucien: "que o Papa herético deve ser compelido pelos Bispos católicos e Cardeais ou qualquer autoridade competente da Igreja a condenar os erros do CVII e suas reformas".

Citação de Lucien:

A primeira e mais importante razão é que a Tese de Cassiciacum não apela para nenhuma teoria pré-existente sobre o problema de um papa herege. Ela se mantém à parte do debate. Como veremos, é isso que lhe confere força e permite estabelecer, em seus elementos essenciais, independentemente de discussões teológicas abertas, algo que se aproxima de uma certeza da ordem da Fé. A segunda razão é que a Tese de Cassiciacum, que afirma que o ocupante da Sé não foi deposto, não DIZ absolutamente que ele deve ser deposto.[9]

Breve refutação: continuístas, R&R e sedeprivacionistas possuem a mesma atitude prática, e, isso entra em completa contradição com a Tese do Papa material, pois as três posições afirmam que estão longe do debate acerca de um Papa herético ser deposto. Mas para que se pense na possibilidade de um Papa herético ser deposto, necessariamente se afirma que um Papa pode ser manifestamente e notoriamente herético e permanecer Papa[10]. Ora, já foi definido que a primeira sede não pode ser julgada por ninguém[11], a não ser que, por heresia notória, como afirmam os autores sagrados, o Papa seja deposto por Lei Divina, coisa que os sedeprivacionistas, continuístas e R&R rejeitam na prática, embora não rejeitem a possibilidade. Logo, tanto os continuístas como os R&R e os sedeprivacionistas, longe de proteger a indefectibilidade da Igreja, longe de conservar a Apostolicidade da Igreja e longe de tratarem a Igreja pós-conciliar como uma Nova Igreja, tratam-na como se fosse a VERDADEIRA IGREJA CATÓLICA ENSINANDO HERESIAS.

Esse argumento (do papa cair em heresia e permanecer "papa material") também é endossada pelo Mons. Guerrard:

"O processo normal, canônico, é conhecido. O que resta de Autoridade na Igreja militante, se o Papa cai em heresia ou cisma, é a pessoa moral (doravante designada como M) constituída pelo conjunto hierárquico dos Bispos residenciais que professam (então!) integralmente a Fé Católica. Esta pessoa moral M deve dirigir ao 'papa' (ex Papa) uma intimação e deve convocar o Conclave, o que assegura pelo menos em potência a Sucessão apostólica, considerando-a formaliter (é o que acontece quando morre um Papa, em particular se o Conclave devidamente convocado deve ser diferido por causas extrínsecas). Se o 'papa' persiste em seu erro, é ipso facto fora da Igreja e não é então mais papa em tudo, nem mesmo materialiter" (Dom Guérard des Lauriers, em entrevista ao Instituto Mater Boni Consilii, na Revista Sodalitium, nº 13).

Em suma, a formalidade ou materialidade do Papado (em ordem prática, conforme os sedeprivacionistas) depende exclusivamente de algo humano: a formação doutrinária ou honestidade moral de um homem, o que seria absurdo afirmar, haja vista que a Igreja já teve diversos Papas moralmente questionáveis, mas que nunca ensinaram heresias e nem causaram mais estragos na Igreja do que heresiarcas como Martinho Lutero.

4º ARGUMENTO: Lucien afirma que, pelo fato de que a Igreja nunca definiu uma doutrina acerca de um Papa herético poder ser deposto ou não, cabe apenas notar a contradição da doutrina do CVII com a tradicional e notar que Paulo VI e João Paulo II perderam sua autoridade no momento em que promulgaram tais erros e levaram adiante suas reformas. Lucien também afirma que, é observável que essa contradição exista, mas que não é possível provar com certeza necessária que o autor de tal contradição é um herege manifesto e é o autor de tais heresias, pois falta o julgamento de uma autoridade competente assim como falta da parte do acusado um reconhecimento de culpa.

Citação de Lucien:

Por outro lado, a questão de saber o que de fato acontece em relação a um papa herege continua sendo discutida abertamente e nunca foi decidida oficialmente pela Igreja. Como resultado, é impossível por meio desse caminho chegar a uma conclusão que se imponha legalmente a todos os católicos e que a Igreja tenha que considerar como tal. O leitor agora tem um esboço geral da situação da qual se desenvolveu a Tese de Cassiciacum.[12]

Breve refutação: que a Igreja nunca definiu se um Papa herético possa ser deposto é de todo algo inimaginável de se acontecer, haja vista que uma Tradição inteira, tanto dos Padres da Igreja quanto dos Doutores e Teólogos afirmam que é impossível que haja no passado, presente e futuro um Papa herege. Eles consideram a questão do Papa herético como uma hipótese teológica. E mais: quando os teólogos falam de Papa herético cair ipso facto de seu pontificado, tornando-se automaticamente réu diante da Igreja, eles falam de uma queda por heresia privada. De acordo com eles, seria o suficiente para o Papa cair do pontificado. A tese do Papa material, como já foi demonstrado nos vídeos do canal do YouTube do Apostolado Santa Margarida Maria Alacoque, se baseia na doutrina da Sucessão Apostólica meramente material no Episcopado, e não na Sucessão do Primado Petrino. Não existem teólogos que defendam ou sequer cogitem a doutrina de uma Sucessão Petrina meramente material. Trata-se de uma novidade teológica carregada de heresia, haja vista que atenta contra a Pastor Aeternus, capítulo IV, do Concílio do Vaticano (Anexo 1):

[...] E esta doutrina dos Apóstolos abraçaram-na todos os veneráveis Santos Padres, veneraram-na e seguiram-na todos os santos doutores ortodoxos, firmemente convencidos de que esta cátedra de S. Pedro sempre permaneceu imune de todo o erro, segundo a promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo feita ao príncipe dos Apóstolos: "Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos.

Portanto, é uma heresia dizer que um Papa pode ser herético, pois a Cátedra de São Pedro permanece imune de todo o erro em virtude da Promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo. Se todo o edifício argumentativo da Tese de Cassiciacum elaborada por Dom Guerrard des Lauries e Lucien se baseiam na hipótese de que João XXIII – Francisco foram eleitos papas, mas caíram por heresia, este mesmo edifício RUI completamente diante do Concílio do Vaticano. A Tese de Cassiciacum afirma, em ordem prática, que as portas do inferno prevaleceram na Igreja, que a promessa de Nosso Senhor falhou, que o Papa é um bispo igual a qualquer outro bispo ao plicar a doutrina da Sucessão Apostólica material à doutrina da Sucessão do Primado de Pedro, resultando assim na heresia da colegialidade do Vaticano II.

Em suma: Mons. Dolan foi generoso quando afirmou que a Tese de Cassiciacum tem sabor de heresia. O sedeprivacionismo é uma heresia.

5º ARGUMENTO: Trata-se de uma conclusão prática. Lucien, assim como todos os sedeprivacionistas, R&R e continuístas, creem que a solução é rezar pela conversão do Papa material ou Papa herético e até mesmo instiga-la, independentemente de a pessoa em questão ser um maçônico pestífero, um aniquilador da doutrina e da moral ensandecido, um modernista da mais alta estirpe, um sionista blasfemo, um perseguidor de tudo o que é de mais Sagrado, um heresiarca mais perigoso do que Lutero e Ário e, enfim, independentemente de todos estes "Papas materiais" terem recebido a doutrina tradicional e depois terem a rejeitado há mais de 50 anos. No final, nem Lucien dá certeza das consequências práticas, mas apenas de modo hipotético:

Ela apenas diz isso hipoteticamente: ele deve ser compelido (pelos bispos católicos e pelos cardeais, ou por qualquer autoridade competente na Igreja) a condenar os erros; somente após tal demanda oficial feita por parte daqueles que têm Autoridade na Igreja é que a deposição pode ocorrer: ou seja, quando o ocupante do Trono Apostólico se recusa a confessar a Fé e a condenar os erros que a contradizem. (Somente então os Bispos e/ou cardeais poderiam declarar oficialmente que ele está deposto, sendo Cristo o responsável por depô-lo.) No entanto, se o ocupante do Trono cumprir com a demanda: então seu ato de condenar os erros estabeleceria ipso facto que ele é formalmente o Papa. Por um lado, a Tese de Cassiciacum estabelece claramente as diferentes partes de seu argumento, especificando o grau de certeza objetiva que pertence a cada parte; por outro lado, ela expressa claramente suas críticas às outras teses.[13]

Breve refutação: Para os sedeprivacionistas, tudo o que ocorreu há mais de 50 anos pós CVII não é de certeza necessário imputável como crime dos Antipapas João XXIII – Francisco, ainda que cada reforma e ação tenha sido defendida por eles com paixão. O que se pode dizer de Lucien? O que afirma o psiquiatra Rudolph Allers e o psicólogo Martín Echavarria: que neurótico vive um conflito metafísico no qual ele cria para si uma mentira existencial que subverte a ordem axiológica objetiva e o condena, por isso mesmo, a uma vida "inautêntica", ou seja, ele sobrepõe suas preferências subjetivas no intuito de negar a realidade por esta ser insuportável para ele, seja em ordem teórica ou em ordem prática. Sabemos que as consequências da total vacância da Sé levam a pessoa a uma consequência prática de muitas cruzes e, não à toa, nem mesmo a Tese de Cassiciacum foi o suficiente para conter o respeito humano de Lucien, que inclusive hoje em dia é um apóstata modernista que ensina a Liberdade Religiosa do CVII como algo de mais católico que já existiu em um Concílio Geral.

Síntese:

Caro leitor, sei que a exposição de Lucien possui mais de 60 páginas, mas, como o pode ter notado, toda a sua argumentação é baseada nestes 4 argumentos principais que são como a raiz da árvore. Em síntese, vamos entender de forma simples a sua argumentação:

  • Paulo VI e João Paulo II endossam e ensinam publicamente e notoriamente de modo pertinaz a doutrina do CVII que é contraditória à doutrina da Igreja Católica.
  • Ambos foram eleitos validamente, mas perderam a sua autoridade por conta dos ensinamentos contraditórios à doutrina católica.
  • A Igreja nunca definiu algo sobre a controvérsia acerca de um Papa herético poder ser deposto e sobre quem poderia depô-lo.
  • Não se pode provar com certeza necessária que Paulo VI e João Paulo II tem culpa nestes ensinamentos contraditórios porque não há autoridade que os julgue e porque ambos não assumiram a culpa.
  • Os Bispos tradicionais devem instigar ao Papa material que se converta e condene as doutrinas do CVII. Feito isso, ele será Papa formal.

Refutação:

Para que o leitor não se sinta cansado com uma exposição longa acerca dos erros gritantes de tais princípios, irei utilizar apenas citações para refutar cada um argumento, e sempre que elas ocorrerem, cada citação será enumerada de acordo com o número da proposição de Lucien a ser refutada.

  • Ensinar algo que seja contraditório com o ensino católico é ensinar heresia:
Tratamos agora da heresia enquanto implica corrupção da fé cristã. Ora, não implica essa corrupção termos opinião falsa sobre o que não é de fé, como as proposições geométricas, ou ciências semelhantes, que de nenhum modo podem a ela pertencer; mas só quando professarmos falsa opinião em matéria de fé. Ora, uma doutrina pode ser de fé, de dois modos, como já dissemos: direta e principalmente, como os artigos da mesma; ou indireta e secundariamente, como aqueles princípios que, sendo negados, acarretam a alteração de algum desses artigos. Ora, de ambos esses modos pode haver heresia, da mesma maneira que pode haver fé.[14]

Quando o Doutor Angélico fala de "corrupção da fé", "falsa opinião em matéria de fé", "princípios que, sendo negados, acarretam a alteração de algum desses artigos" (da fé), tanto de um modo como de outro pode haver heresia, assim como pode haver fé. De que modo? Explico: quando se ensina que Jesus Cristo é o Verbo que se fez carne (Jo 1, 1-28), ou seja, que Jesus Cristo é Deus feito homem, assume-se consequentemente que Ele é o único Deus vivo, e, portanto, que a Igreja Católica é a religião verdadeira, nega-se que Jesus é Deus quando se defende a doutrina da liberdade religiosa do CVII, pois tal doutrina sustenta que todas as religiões são caminho de salvação assim como todas as religiões são boas e dignas de assentimento. Como se nega a divindade de Cristo nisso? Simples: se todas as religiões são caminho de salvação, logo Jesus Cristo é rebaixado à apenas "mais uma das divindades dentre as diversas religiões". Logo, a doutrina do CVII atenta principalmente contra a divindade de Nosso Senhor, e tal doutrina é a doutrina do Anticristo, tal como afirmou o Apóstolo São João Evangelista em sua primeira epístola. De modo contrário: negar o princípio da liberdade religiosa, algo que é de fé dos modernistas, é um assentimento à fé católica. Se para Lucien ambas são contraditórias, como pode concluir que não há como provar que Montini e Woytjla são réus por crime de heresia? É clássico no pensamento sedeprivacionista a atitude de afirmar e ao mesmo tempo negar um fato. Se é contraditório, é herético, e se é herético, já está julgado, pois aquele que não tem a fé já está julgado (Jo 3,18).

  • Nem Montini e nem Woytjla foram eleitos validamente, pois para ser eleito validamente é necessário ser católico:
Nos anos de 1970, o príncipe Scortesco, voltando de Roma à Paris, revelou que detinha a prova formal de que Montini era maçom. Ele foi assassinado no espaço de uma semana e os documentos desapareceram. Wincker revelou que o sobrinho de Rampolla (maçom) tinha formado um grupo de cardeais que esperava "ter êxito com Montini, lá onde Rampolla tinha falhado" e que Montini era um agente da judiaria (Winckler conseguiu infiltrar-se neste grupo de traidores, porque o consideravam erroneamente um marrano.[15]

Além disso, Montini era adepto da doutrina panteísta de Teilhard de Chardin, doutrina esta condenada por Pio XII e colocada no INDEX de livros proibidos. Tal adesão ocorreu antes de sua eleição inválida:

O homem moderno, não aconteceria, um dia, à medida em que os seus estudos científicos progredirem e descobrirem leis e realidades, escondidas por detrás do rosto mudo da matéria, a estender o seu ouvido para a voz maravilhosa do espírito, que palpita nela [heresia panteísta, vulgarizada na década de 50 por Teilhard de Chardin]? Não será esta a religião de amanhã? Einstein, ele próprio, viu a espontaneidade de uma religião do universo. Ou não será essa, talvez, a minha religião hoje?[16]
Um dos amigos de Montini, Jaques Maritain, falecido no ano de 1973, escreveu: "À cristandade medieval de tipo sacral e teocrática [...] deve suceder, hoje, uma nova cristandade caracterizada [...] pela emancipação recíproca do temporal e do espiritual, e pelo pluralismo religioso e cultural da cidade". Esse homem foi o pai da liberdade religiosa do CVII e condenado antecipadamente por Leão XIII.[17]

Em se tratando de Woytjla, antes de sua eleição ele:

Publicou em 1969, em polonês, um livro herético, traduzido posteriormente para o francês: Personne et acte. Uma das ideias dessa era de que "o homem se completa a si próprio como pessoa" e "é cada ato que representa uma realização da pessoa", sendo a norma para fazer um ato a "subjetividade pessoal", ou seja, as noções de bem e mal, verdade e erro são iguais. Mas ele vai além: "a pessoa é transcendente pela sua ação própria, porque ela é livre". Sobre a verdade, ele afirma que "o poder normativo da verdade encontra a sua explicação no dever", este que consiste em "realizar-se a si mesmo", que nada mais é do que "ser feliz", ou seja, o homem independe de Deus e o paraíso não é o fim do homem, mas sim realizar-se em si próprio na própria verdade em seu dever pessoal e subjetivo. Isso é modernismo, humanismo e personalismo. Ambas as doutrinas filosóficas heréticas.

  • Acerca do Papa herético, brevemente direi juntamente com São Roberto Bellarmino e a maioria de teólogos assim como os Padres da Igreja: dizer que um Papa possa cair em heresia é afirmar que as portas do inferno prevaleceram na Igreja.

A oração de Cristo não pode falhar e um Papa, por mais imoral que seja, não pode cair em heresia, e jamais caiu em heresia. Os casos em que a FSSPX, principalmente no famoso "Catecismo da Crise na Igreja" de Gaudrón, denotou como quedas de papas em heresia (Libério, Honório etc.) já foram refutados por São Roberto Bellarmino e são opiniões heréticas de autoria dos Protestantes Centuriadores de Megdeburgo. Vide: Do Romano Pontífice.

  • Sobre a certeza necessária de que Paulo VI e João Paulo II eram culpados de heresia, isso é mera negação da realidade objetiva. Para constatar que alguém é herege, a certeza necessária são suas ações e ensinamentos, tal como afirma São Roberto Bellarmino e Santo Tomás de Aquino. Lucien impõe uma condição que parece colocar como necessária uma investigação da consciência do indivíduo. Sabemos que, de acordo com a doutrina da Igreja, o único Juiz do foro da consciência é Deus.

  • Sobre a consequência prática da Tese: esperar a conversão dos maçônicos, inimigos hediondos da Igreja e todas as seitas e sociedades secretas satânicas, eu tenho apenas uma coisa a dizer:

"MALDITO O HOMEM QUE CONFIA NO HOMEM" (Jeremias 17, 5)



[1] Trata-se daqueles que aderiram à nova teologia de Joseph Ratzinger, ou seja, a hermenêutica da continuidade. Tal doutrina defende que se deve fazer críticas construtivas ao CVII e interpretar os atos dos papas "à luz da tradição", ou seja, interpretá-los de modo tradicional. Exemplo clássico: ao se depararem com a foto do Antipapa João Paulo II beijando o Corão, eles afirmam: "você não sabe as intenções dele, pode ser que ele tenha beijado sem saber que era o Corão ou apenas para evitar um atentado terrorista, pois ele é figura pública. Ele pode ter se arrependido e se confessado após o evento.

[2] São todos os adeptos da posição da Fraternidade Sacerdotal São Pio X (FSSPX), Sociedade dos Apóstolos de Jesus e Maria e (SAJM/Resistência de Richard Williamson), comumente chamados atualmente de "Reconhecer & Resistir" ou simplesmente "R&R".

[3] A única posição que aplica a doutrina católica de modo integral sem nenhuma tese (tal como os sedeprivacionistas possuem) ou neogalicanismo (tal como os R&R), que afirma a vacância total da sede apostólica desde o Antipapa João XXIII até o atual Antipapa Francisco, assim como a invalidez de todos os atos desses Antipapas, tendo sido o último sucessor de São Pedro o Papa Pio XII. Essa é a minha posição.

[4] Essa é a posição do autor do escrito em questão, ou seja, Lucien, cuja doutrina já foi brevemente explicada: a do papado material.

[5] Trata-se da posição continuísta.

[6] Trata-se da posição da Fraternidade Sacerdotal São Pio X. "Ecône" é a cidade onde está o seminário principal.

[7] Observação: muitos sedeprivacionistas hoje em dia abandonaram a distinção entre sedevacantismo e sedeprivacionismo, passando a revolucionar os conceitos, se auto intitulando de "sedevacantistas tesistas", enquanto nós nos tornamos os "sedevacantistas totalistas" (pleonasmo). Vale salientar que: quem segue a Tese de Cassiciacum não é sedevacantista, mas sim sedeprivacionista. Portanto não há uma divisão no meio sedevacante, mas sim no meio tradicional, e os causadores da divisão são os adeptos da posição R&R e sedeprivacionista.

[8] Lucien, idem, p. 2

[9] Lucien, idem, p. 2

[10] Tal argumento é rejeitado veementemente pelos autores sagrados, vide: São Roberto Bellarmino em sua obra "Do Romano Pontífice" e, mais recentemente, a de Arnaldo Xavier da Silveira "Considerações sobre o Novus Ordo Missae". O único autor que leva essa possibilidade como hipoteticamente

[11] Vide São Roberto Bellarmino "Do Romano Pontífice".

[12] Lucien, idem, p. 4.

[13] Lucien, idem, p. 2-3.

[14] SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica: IIa-IIae, q. 11, a.2, solução. Disponível em: https://permanencia.org.br/drupal/node/4771.

[15] Latour, Loubier e Alexandre: Quem ocupa a Sé de Pedro? Villegenon, 1984, p. 61-62), citado na obra "Mistério de Iniquidade" publicado na Livraria do Seminário São José.

[16] Documentation catolique, 1960, p. 764-765)

[17] Encíclica Longinqua oceani, 6 de janeiro de 1895.

[1] Bernard Lucien, O Problema da Autoridade na Igreja pós-conciliar, p. 1

 

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